sábado, 23 de julho de 2011

O Mal I

- Judeu, mas que coragem! Você tinha muita esperança em conseguir se safar?

- Eu a vomitei antes que ela me sufocasse ou fuzilasse. Expelir o peso da espera pelo milagre foi o que me deixou leve para correr e fugir dos alemães.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Uma balada na História

Prélude et Presto

Ante o alvorecer da Renascença, vivia, nas terras sicilianas, um bardo. Sob a face do bardo, habitava uma criatura estranha, tão poderosa quanto suas trovas. O bardo insistia em se angustiar e se castigar, ao não revelar seu demônio à realidade comum. E se, um dia, ele fosse devorado vivo? E se fosse, este demônio, a tão buscada inspiração a preencher eternamente as lacunas de seus versos?





Allemande

Trabalhando a loucura da alma do bardo, os laços e os traços da dor se evaporam. Quando ele e o alaúde se casam nas nuvens de Lá, se emancipa todo crime e aleivosia das terras de cá.





Courante

Mas ele estava perturbado. Não era ele, verdadeiramente, a se manifestar. Glória e fama empurravam seu ânimo, aproximando-o da tentação de sentir-se uma suposta deidade da arte. Não obstante seu grande reconhecimento, sua voz começava a sentir a fraqueza da alma, que já não encontrava inspiração no Belo exterior. Os astros, que sempre lhe confiaram rimas arrebatadoras, se esconderam sobre nuvens invisíveis, e já nem, sequer, elucidavam o bardo sobre os rios do destino.





Sarabande

A longo passo, este bardo desapareceu da vastidão dos horizontes, lentamente cedendo espaço à sua face outrora renegada. Sua vida tornou-se o início de uma missa, onde os probres seres afligidos e parcamente esperançosos velam, unicamente, por não perder a sanidade. Ainda assim, o bardo sabia que havia algo suspenso no ar, e esta eslúvia sensação era o único bem que ele tentava agarrar e possuir.





Gavotte I et II

Sua vida tornou-se o fim da missa. Agitada. Fervente. Tinha rastros lacônicos do Toque dos céus, que se assomavam numa arte tão valente, vibrante, violenta, que poderia violar o mundo num vira-mundo. O tridente do demônio se revelou: era uma espada luminosa. Então trovejou sua voz e suas cantorias por todos os campos, praias, castelos e bastilhas, ao ponto de inspirar a nova geração, junto a outros bardos tais quais ele, a escalar os próximos degraus rumo às distantes esferas celestes da Sabedoria.





Gigue

E se abriram os portões dos jardins do Novo Mundo! As novas terras e mares de encantos e desastres desafiavam os limites da antiga λογοσ* que insurgia ao horizonte. E um espectro, um espectro instigante e diabólico, passou a rondar as terras européias, o espectro de que a Verdade era próxima. Mal sabiam os ascendentes heróis que o caminho ao Renascimento real seria muito mais longo! Muito mais assustador! Entretanto, o mero caminhar em Sua direção já revela milagres além da órbita da humanidade. Milagres que fizeram os astros girarem novamente em torno do Sol, o mesmo Sol que já se ouvia nos versos do bardo e que brilhava nas frases do alaúde. E foi este singelo bardo, antes atrativo regional, que, em seu despertar pessoal, adquiriu importância milenar e abrasou os corações do ser humano, tornando os panoramas, doravante, abertos.




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*Logos: razão, capacidade que difere o ser humano dos outros animais

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Se o rio precisa do mar,
para que descer a montanha?
Se a façanha da água é o encontro,
só em um ponto vai desembocar?

Para que o eterno ciclo de busca e (des)encontro?

Para que o obstáculo, se a união é inevitável?

Para que a tortura, se a morte é inevitável?

Para que o casamento, se o amor não vai ter fim?

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Apenas Castelos

Castelos nas correntezas do tempo
Castelos insolúveis nas tempestades
Castelos nas profundezas dos vales
Castelos nos penhascos imponentes

Castelos de sangue, morte e Cruzadas
rubros horrores nas rochas rajadas
tem um quê de intocável
tem um quê de diabólico

E quanto mais o tempo passa
mais silenciosos ficam
os sussurros dos corredores
os passados das torres

Nós definhamos, Eles não
Tem algum tipo de divindade
tem um quê de cálido
tem um quê de austero
Tem um Mistério inerte

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Sono

Uma imagem começando a se formar:
nos recepcionam, as portas do Surreal!
A realidade - uma ilhota em alto-mar,
e a mente efervescendo no céu atemporal.

Sem igual, mergulhar nas fantasias!
Suspirar o incenso do ar feiticeiro!

No eslúvio ritual,
eis a sua transfigura
num espelho transcendental.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Cárcere Das Almas

Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,
Soluçando nas trevas, entre as grades
Do calabouço olhando imensidades,
Mares, estrelas, tardes, natureza.

Tudo se veste de uma igual grandeza
Quando a alma entre grilhões as liberdades
Sonha e, sonhando, as imortalidades
Rasga no etéreo o Espaço da Pureza.

Ó almas presas, mudas e fechadas
Nas prisões colossais e abandonadas,
Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!

Nesses silêncios solitários, graves,
que chaveiro do Céu possui as chaves
para abrir-vos as portas do Mistério?!

(Cruz e Sousa)