terça-feira, 12 de novembro de 2013

Anfitriã e Convidado

Eis o manto dessa grande mata verde
Toque o chão com pés descalços
Cheire as flores no quintal

Gosto do odor que nos trazem, os ventos
Lindo, o riacho corrente
Glória à montanha solene

Entre em minha casa, veja a sala, o quarto, estantes
Veja que lugar escuro
O café é o meu amigo

Luzes e sombras dão o tom de sua voz
Grandes contrastes que eu amo
Sabedorias vertendo dos ares

Aqui estive, amor, sozinha, o céu nublado
Não roguei por ti, pra amar
Mas a casa fez-se um templo

Acenda um incenso e estarei bem bem-vindo
Sou qual fumaça e me espalho
Não sou amor convidado

Vem deitar o amor aqui na cama, que tem febre
As paredes falam, clamam
Por mim, eterna anfitriã

Por nós que deixamos abertas
As portas pra vida impossível

Por ti que acolhe a história minha
E agora prosa em novos álbuns

Forças que beiram o fim, a loucura...
Te empurraram ao meu mundo!
Universo, luz, estrelas
Trazem augúrios da busca infinita.

Vem viajar nas vertigens do Ser
Cancele aquele dia tolo!
Eu te amo! Vem bastar
Fazer meu mundo ser o seu!
Anfitriã, do seu  mundo me alago.
Como eu o amei! Como eu o amei!

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Soneto sincopado de quem ama e é amado

Te entrego minha alma,
toda a flora de desejos.
Um arpejo te devora.
Brilha, a estrela d'alva.

Você tem a luz.
Sinto, cego, o seu calor.
Grande amor, atrás do véu,
vejo: me conduz.

Minha felicidade muda,
agora abriga a sua.
A paixão é um nevoeiro.

De ouro tu me faz ser herdeiro.
Festejo em plena rua!
És porta à casa de um Buda.

Sobre quem não sabe ser amado

Você vem e
Eu me afasto

O jogo do amor de Eros
É um jogo de ganhar e de perder

Você me traz luz
Só devolvo escuridão

Que bondade viciada!
O Mal permeia a natureza inteira!
Ou será mesmo desumano, aquele que
Se desconforta com a ternura?

Você me convidou ao seu paraíso
Vim, vi, venci e fui

Não é mentira... não é desumano.
Temos um fascínio por destruir.
Saber amar é ganhar, é iluminação.
Perde quem se perde a pisar as flores
Nos passos da dança da depressão.

Você me ama
Mas quem sou eu?

Você me ama
Quem sou eu, seu eleito?

Você me ama
E eu não sei o que é amar

Você me ama
E precisa ter paciência comigo!

Você me ama
Sou selvagem e tenho sede de ferir

Você me ama
E eu quero aprender a viver

Você me ama
E eu nem amar a vida sei, ainda

Assim,
Você vem e
Eu me afasto

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Par

Pérgolas em parafuso!
Vinhos visam vossa voz.

Partimos para conquistar,
outorgar, atroz, à nação,
alçando ao mastro da bandeira,
violenta segregação,

e implodir a torre!

No último andar,
há rainhas se despindo
dos espinhos, das coroas,
aturdindo brisas tolas

com o perfume secular!

Atire-se à vertigem
e as brisas dar-te-ão asas!

Não há paz no alto do castelo.
Nosso lugar é o confronto.
Pois encontrar é um eterno pôr-se a buscar.

domingo, 29 de setembro de 2013

Manhã de praia fora da moda carioca

            É domingo e chove. É algo injusto, pois deveria chover mesmo é nos dias úteis. Assim, os trens lotados não ficariam tão quentes com seus passageiros ardentes pela vontade de trabalhar, vontade que tem seu auge na segunda-feira. Nos fins de semana, os trens não ficam lotados e a chuva esfria mais a paisagem neutra do cinza urbano. Na verdade, podem até ficar lotados, mas é preciso que haja um evento importante na cidade, como uma partida de futebol.
            Hoje de manhã não tem jogo nenhum, pois eles sempre começam à tarde, sempre em horários padronizados tais quais as vidas das pessoas por aqui. Algumas pessoas, quando têm dinheiro para algo diferente, saem desse padrão, o que não quer dizer que não se deparem com eventos importantes também. Nesta manhã, aqueles que vieram à praia podem estar presenciando um evento distinto, assim como podem não estar. Afinal (passando a bomba para Saint-Exupéry), o essencial é invisível aos olhos.
            Um desses possíveis eventos distintos trata de uma mulher que decidiu se banhar logo hoje: um domingo com chuva. Enquanto se deixava apenas com a roupa de banho, os transeuntes podiam admirar sua beleza. Estava muito bem dentro do padrão! Alguém mais excêntrico poderia até reclamar de uma ou outra coisinha. Nas ondas, mergulhou e nadou como uma sereia! Poderia ser uma Iemanjá, também. Tudo depende dos olhos de quem vê. Os mais poéticos poderiam dizer que ela velejava ao sabor de um vento delicioso, mas que, comigo, só está tentando zunir os papéis que rabisco agora pra longe. Qualquer afirmação estaria compenetrada em subjetividade. Mas, de fato, para um punhado de cariocas, aqueles que se amantam da cor da paz, "Iemanjá" diz muito mais do que "sereia".
            Com qual adjetivo fulano lhe condecoraria não importa. Mais importante é ver o quanto as pessoas gostam de julgar aquele e qualquer outro acontecimento natural, e julgam mesmo até as coisas mais artificiais. Falando agora de brasileiros, pois não apenas os cariocas gostam de assistir a novelas, julga-se muito os atores e atrizes pelos papéis que desempenham com suas personagens. Será impossível encarar Renata Sorrah sem enxergar a face da vilã Nazaré Tedesco? Será que a maioria dos homens se deslumbra com o corpo escultural de nossa banhista sem achar rapidamente a mulher dos sonhos naquelas curvas?
            Ah! Que mente arredia, essa que insiste em colorir o preto e branco do mundo a seu modo! Ainda não aprendeu que o branco já é a fusão de todas as cores? Todos sabem que aquela mulher é um momento ímpar do universo, uma pessoa naturalmente diferente, assim como todos no mundo são diferentes entre si. Entretanto, anseiam por puni-la com seus próprios desejos e estórias a cada instante de seus olhares. Bem, sejamos também um ombro amigo. Talvez o façam por não terem coisa melhor para pensar. Se bem que, se apagássemos todos os valores dos evangelhos sociais, não sobraria uma ideia melhor que todas as outras. Nem a ideia de Beleza, de Vida, de Amor, de Fé, de Igualdade, de Felicidade, de Infinito, de Mal.
            A gaivota que sobrevoa os céus e pressente perfeitamente as divisas entre terra e mar tem a plena liberdade para escolher o horizonte ao qual se lançará. Acredito que sempre preferem se manter próximas às praias e isso deve ser devido à ecologia regente. Da mesma forma, a estadia e partida das pessoas é determinada por alguma ecologia. Capitalista, no caso de todo o ocidente. Esqueça-a e verá as pessoas se perdendo em meio ao sonho da liberdade. Apenas os mais destemidos continuarão conseguindo pegar o mesmo trem em todas as segundas-feiras, mas não sem que o desassossego primordial do existir esteja, então, em efervescência.
            Agora a mulher quer, simplesmente quer, ficar deitada na praia e absorver o ar úmido e agradável que repousa após a garoa. A mansidão e leveza de seus movimentos poderia enganar toda a Av. Atlântica, não fosse o fato de a inquietude ser um sentimento compartilhado por todos. Saindo das águas, cada passo da sereia já ia cumprindo com zelo sua vontade de se debruçar sobre o fofo continental das areias. Veja! Não é claro que as pessoas nos trens de todos os dias estão fazendo o que querem todo o tempo, como ela? Elas escolheram cumprir a ecologia do capital. Sabem que podem virar a esquina a qualquer momento, mas o preço da autonomia seria uma duríssima tomada de responsabilidade pelos próprios atos. Se lhes perguntar, jogarão a culpa de ter de trabalhar para o dinheiro, o que é uma mentira, afinal só trabalham porque querem, em última instância. No entanto, querendo ou não, o ter-de-escolher é uma operação incessante e seria aconselhável que os passageiros tomassem consciência desse processo substancial. Assim, a todo instante, tanto os passageiros dos trens, quanto os dos ônibus, metrôs e barcas, tanto quanto a mulher na praia, respiram e navegam sem mapa e sinalização pelas estradas. Mas... de qualquer forma, assim seria mesmo que tivessem consciência do ato da escolha. Mesmo sendo livres.
            Aspiro, logo existo! Levantou-se do mar, ascendeu de volta à terra e se deitou. Por quê? De pé, aspirava ao conforto de sentir as costas na areia. Por não ser a areia, por não ser a chuva, por não ser igual às coisas do mundo, precisa se movimentar para ter e concretizar seus ideais. Da terra ao mar, do mar à terra... seja qual for a direção e o sentido, todo andar é precedido por um volo original. "O mundo é minha casa, onde aspiro a uma pátria melhor".
            Saindo da praia, ruma a mensageira de desilusões para algum lugar. Sua casa, talvez. És bela e divina, mas és mais uma a olhar para o mundo com olhos enjaulados em subjetividade. Aperte firme seu cinto de segurança e vá com fé para onde qualquer uma das ecologias te levar! A chuva já estiou pelos bueiros da cidade. Mover-se e desejar algo é a única forma de evitar que seu destino seja o mesmo.
            Os trens, as barcas, os noveleiros, os mais poéticos... os trens circulam pela cidade nos trilhos do vórtice de perdições que é o lado escuro da liberdade. É fundamental estar insatisfeito e incompleto para que a indeterminação não seja absoluta, para que sempre amanheça um novo segundo. Exigência da casa. A natureza nos concebe em seu berço e rapidamente nos chuta porta afora. Àquele que se inunda de silêncio e plenitude é reservado o pior dos fins. Pois "o mundo é lar, mas também inóspito".

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Ritual de Áries e Leão

Os arianos devem saber o que fazer.
Dedico, então, a leões generosos demais.

Partem o chão,
os legionários.
Rumo à arena!
Rompem trovões!

Na praça, uma guerra,
o fim de um reinado,
queimando, raiando
a luz da Justiça.

Corram já,
Salamandras!
Façam o fogo rugir!
Arruínem,
Salamandras!
Façam fumaça subir!
Torrem o que jaz em caos!